Os lugares onde nunca mais voltei, mas que ainda me habitam

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Tem lugares que eu nunca mais pisei, mas que ainda moram em mim.
Quartos escuros, banhados pelo brilho frio de um monitor CRT.
A luz do modem piscando como um farol numa madrugada silenciosa.
Ninguém por perto. Só eu e alguma banda que berrava coisas que eu nem entendia direito — mas sentia.

Não era tristeza. Era solidão.
Mas era minha. Domada, domesticada.
Aprendi a conversar com ela quando todo o resto só queria fazer barulho.

Enquanto o mundo dormia, eu cavava túneis digitais em busca de outros como eu.
E achava.
Nunca soube o rosto deles.
Mas eles também estavam acordados às três da manhã.
E isso bastava.

Eu não falo desses lugares com saudade boba.
Não queria voltar no tempo.
Mas tem noites que tudo o que eu sou hoje parece ter nascido ali — no silêncio, no isolamento, na ausência de aplausos.

Ali eu aprendi a não esperar por ninguém.
A não precisar de plateia.
A confiar nas minhas próprias mãos, nos meus próprios olhos, no que eu podia construir mesmo quando o mundo parecia rir de mim pelas costas.

Muita coisa mudou.
Hoje tem gente por perto, tem responsabilidades, boletos, reuniões, obrigações.
Mas às vezes eu olho pra tela do computador e por alguns segundos, aquele quarto volta.

Não é físico.
É memória codificada.
É tatuagem invisível no meu jeito de ser, de pensar, de continuar.

Hoje eu caminho por entre códigos, ideias, silêncio e propósito.
Trago comigo os fragmentos daqueles lugares que me construíram sem que ninguém visse.
Ainda prefiro o canto da sala. Ainda converso mais comigo mesmo do que com os outros.
Mas agora, eu sei o valor disso tudo.

Tem gente que aprende na escola.
Tem quem aprende com aplauso.
Eu aprendi com o vazio.

E nesse vazio, eu descobri que o mundo não precisava me entender.
Bastava que eu continuasse.

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